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CENTRO E MEMÓRIAS

Fortaleza sem memória: praças
e parques do Centro da Cidade

Apesar da importância histórica e social do Centro de Fortaleza, polos de lazer, que antes marcaram a capital, hoje sofrem descaso do poder público e da própria população.

Por : Luã Diógenes

Em meio ao grito de comerciantes, o rebater de sacolas de compras e as rápidas passadas por suas calçadas desiguais, o Centro de Fortaleza é o local de maior fluxo de pessoas na cidade. Um polo comercial  e popular da capital, passagem fundamental de milhares de fortalezenses todos os dias.

Mesmo carregando essa “áurea” dentro da metrópole e sustentando sua importância, o Centro está longe da valorização dos seus tempos de Belle Époque das décadas de 1930, 40 e 50, quando este era símbolo também de lazer dos mais abastados da época. Baseado na arquitetura francesa, o bairro virou um grande marco da Urbanização de Fortaleza. Foi a época do surgimento dos bulevares, cafés, parques e praças que embelezavam a cidade e eram “passarelas” para o encontro de políticos, intelectuais, damas da sociedade e de todos os que possuíam uma boa condição financeira.

Hoje, o cenário é bem diferente, o lixo espalhado nas ruas polui o olhar de quem passa no local. O charme e a elegância de outrora foram substituídos pela correria de pessoas que nem imaginam o valor daquele local. Os cafés e bulevares não existem mais, os casarões quase todos foram demolidos, e as praças e parques, remanescentes dessa época de ouro, não conseguem carregar mais seu peso dentro da cidade.

O Professor do curso de Geografia da  Universidade Federal Ceará, José Borzacchiello da Silva, estuda há anos a urbanização da cidade e vê com uma grande tristeza essa desvalorização do Centro, tanto pelo olhar da população como do poder público. “É um invejável polo de atividades, entretanto, carece dos devidos cuidados e de atenção. Seu potencial simbólico remete a fatos importantes da história cearense e brasileira. As praças da área central constituem um patrimônio de grande peso e expressão. Nenhum bairro da cidade possui logradouros como o Passeio Público, praças como a do Ferreira e a José de Alencar”, afirmou o Geógrafo.

Para José Borzacchiello é doloroso ver a situação do Centro de Fortaleza, tanto como estudioso e também como morador. As praças, antes frequentadas, se tornaram símbolo de uma cidade sem memória. “A Cidade da Criança é um mundo à parte, uma ilha de tranquilidade em meio à cidade tensa e frenética. O Centro não pode e não deve ficar alijado da integração à cidade. O prejuízo é muito grande. São vários prédios abandonados, salas de edifícios comerciais vagas ou alugadas por preços irrisórios” - disse o professor com voz indignada.

O bairro possui  
5,45 km²
Praças
17
Equipamentos Culturais
13
Praças, parques e esquecimento

O Vistoso Jatobá na Rua Dr. João Moreira ainda é símbolo de imponência diante de uma cidade devastada e decorada por concreto e asfalto. Mas, longe da sua exuberância que resiste há um século, seu logradouro está longe de ser lembrado como marco histórico do Ceará. Antigo Campo de Pólvora, o Passeio Público, como costuma ser chamado, foi palco da Confederação do Equador, movimento surgido em 1824 no Pernambuco que pretendia implantar um regime republicano no Nordeste. Na praça, em 1825, foram fuzilados cinco heróis da revolução, entre eles o Padre Mororó.

Em 1879 passa a se chamar Praça dos Mártires, em homenagem aos mortos. No mesmo ano, o negociante português Tito da Rocha cria o verdadeiro Passeio Público em 1880. O local era muito visitado pela sociedade de Fortaleza e possuía três patamares, com o objetivo de separar a elite, a classe média e os pobres. Os menos abastados só podiam sentar nos bancos de vista para a rua. Os comerciantes locais visavam o parque e sua vegetação. Já os ricos, tinham como cenário o mar, que até hoje é símbolo de ostentação, mas agora em outros pontos da cidade.

Depois de algumas obras de revitalização nas últimas décadas, o Passeio Público restaurou uma “aparência social”, que o permite receber a população aos domingos para o agora tradicional “chorinho com feijoada”. Na semana, a imagem é diferente, o local é ponto de prostituição e de moradores de rua, o que pode ser inseguro para os visitantes. José Evangelista, de 72 anos, trabalha como taxista no local e afirma que até para trabalhar é ruim. “Ninguém quer vir aqui, né? Não tem clientela, o povo tem medo, tanto de dia com de noite, é esquisito. O pessoal tem medo até de passar na calçada quanto mais de entrar aí”, afirma o motorista, que estaciona seu Táxi na frente da Santa Casa de Misericórdia, localizada ao lado do Passeio Público.

Revitalização do Centro: caminhada a passos lentos

Desde o Governo Juracy Magalhães na Prefeitura do Município, a revitalização do Centro de Fortaleza é pauta. Apesar de lento, importantes mudanças para a sua requalificação já foram feitas, como a retomada das atividades do Cineteatro São Luiz, ações como o Natal de Luz e o Carnaval de Fortaleza.

 

“Desde 2017, estamos com o programa Você Faz Fortaleza, que a população escolhe o que deve ser feito ou não. Questionado sobre uma reforma, foi escolhido a Cidade da Criança para receber investimento municipal de R$ 10 milhões em revitalização. Eu estou imaginando obras que beneficiem as crianças e os idosos, que são quem mais utilizam o Parque hoje em dia. São tantos equipamentos no mundo inteiro para esse público, e eu espero que nosso espaço, incluindo o Santuário da Praça Coração de Jesus, até pela sua grandeza e importância histórica, ganhe vida e se torne referência nesse sentido", pontua Adahil Fontenelle, Secretário da Regional Centro.

Questionado sobre os outros pontos do Centro, o secretário afirmou que medidas estão sendo tomadas para reverter a situação. “Hoje temos Carnaval no Centro, atividades no final de semana. A Praça General Tibúrcio, nossa praça dos Leões, por exemplo, voltou a ser local de encontro de Jovens na sexta-feira, sempre com muita segurança. Tudo uma parceria da Regional do Centro com a Secultfor e queremos fazer ainda mais. O que pedimos, também, é uma ajuda da população, que não tenha medo e frequente o Centro da cidade. Trabalhamos com parcerias, e a ajuda da população é o principal”.

“O Centro não está morto!”

Apesar da insegurança, do descaso e da depredação, o Centro ainda continua vivo no coração dos fortalezenses e dos que adotam a “terra do sol” como morada. Exemplo disso é o casal  Fátima Silva, 62, e Eufrásio da Silva, 75. Os paraibanos fundaram o Bar Lions há vinte anos, que vem movimentando um outro ponto importante do “Centrão”, a praça General Tibúrcio ou praça dos Leões.

O fluxo de gente no bar intensificou de tal forma que uma festa para 300 pessoas se transforma em um evento de arrastar 2 mil. É a Cidade latejando em frenéticos movimentos. Mas, não é novidade haver festas na Praça. Elas acontecem, pelo menos, desde 1998, quando os atuais donos do bar Lions Self-Service assumiram sua gestão. Até pouco tempo, antes de novos grupos redescobrirem a praça e o “Lions”, as festas que aconteciam por ali agregavam um número bem menor de pessoas. Eram calouradas universitárias, comemorações do Festival Cine Ceará, carnavais e eventos particulares.

“Começou assim: um rapaz que trabalha com arte e cultura fez um aniversário aqui e essa festa saiu no Facebook dele. Como a internet é um ambiente de comunicação, isso, rapidamente, toma uma proporção grande. Aí, outro quis fazer aniversário aqui também, gerando um fluxo maior de gente, porque já tava circulando no Facebook. E assim começou”, conta Fátima. Ela emenda: “é um meio de melhorar nossa renda e levantar o Centro da Cidade. Ele precisa de gente, temos que lembrar: o Centro não está morto”.

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